Diretor da CBF fala sobre MP do Futebol

O diretor Financeiro da CBF, Rogério Caboclo, vem expondo em seguidas entrevistas a posição da CBF, com o aval dos clubes do Campeonato Brasileiro, sobre os aspectos que a entidade considera inviáveis na Medida Provisória 671, a MP do Futebol.

Nesta quinta-feira, Caboclo deu entrevista aos jornalistas Alexandre Lozetti e Vicente Seda, do blog Bastidores F.C., do site globoesporte.com, em que ressalta o caráter inconstitucional e intervencionista da MP.

Confira toda a entrevista:

BASTIDORES FC

Diretor da CBF critica MP do futebol: “Ela quer estabelecer luta entre o bem e o mal”

A nova diretoria da CBF, encabeçada pelo presidente Marco Polo Del Nero, não esconde que sua principal meta neste início de gestão é promover alterações no texto da MP 671, a Medida Provisória do futebol redigida por uma comissão do governo federal que propõe condições para o refinanciamento das dívidas dos clubes de futebol, hoje estipulada em R$ 4 bilhões. Enquanto o Ministério do Esporte diz que o texto é inegociável, a CBF, representando os clubes, já disse que não haverá adesão ao que considera “intervencionista” e “inconstitucional”. Nessa entrevista ao blog, o novo diretor financeiro da entidade, Rogério Caboclo (foto), explica o descontentamento com as sugestões da Medida Provisória.

 

O que a CBF não admite no texto da MP?
Não falo apenas pela CBF. Os clubes fizeram sugestões, estabeleceram dúvidas, deram ideias. No dia 8, nos reunimos com os clubes da Série A para considerarmos todo esse material, e ficou decidido por unanimidade que os clubes não vão aderir à MP da forma como está. Ela tem aspectos positivos e relevantes como os critérios e regras do financiamento e o conceito geral de contrapartidas a serem aplicadas, mas deixa de considerar o tema central, um parcelamento de dívidas tributárias, e invade outras searas sem relação com uma legislação dessa natureza.

Então, na visão de vocês, ela se aproveita da brecha financeira para intervir em áreas que não deveria?
Ela estabelece questões alheias ao tema, inconstitucionais e intervencionistas. A MP cria uma cisão da unidade do futebol brasileiro. Os clubes que aderirem ao refinanciamento, a priori, ficam impedidos de participar das competições oficiais. Isso porque precisam conseguir a CND (Certidão Negativa de Débitos) e também os outros clubes aprovarem as alterações em seus estatutos e nos regulamentos gerais de competições. Só voltariam a ter o direito de participar depois de as alterações que a lei impõe serem feitas.

O texto sugere brechas para a formação de ligas. Essa é a intervenção que mais incomoda?
Não tenha dúvida de que esse não é o ponto central, mas é um dos que nos incomodam, entre outros é a intenção nítida da MP, cujo objetivo deveria ser fazer o refinanciamento das dívidas. Ela se aproveita da fragilidade dos clubes e da necessidade de obterem parcelamento para propor o estabelecimento de ligas e a ruptura dos clubes em duas categorias: os que vierem a aderir, no caso de não conseguirem as alterações que a lei determina, teriam de jogar uma liga. Os demais disputariam as competições tradicionais.

Há uma visão geral do assunto que aponta para o seguinte: o governo pressiona os clubes endividados e a CBF os protege. Você concorda?
É exatamente o contrário. A MP procura estabelecer uma luta do bem contra o mal, onde o bem, supostamente, é a criação de ligas e a promoção de uma situação em que alguns clubes insurjam contra o sistema. Dizem que isso significa transparência. Na prática, ela propõe a divisão de forças em competições diferentes, o que vai gerar perda de receita por parte dos clubes. Uma competição vale à medida que adversários duelem em campo. Se você divide isso, a somatória não valerá uma fração do que vale hoje. Seriam duas competições enfraquecidas, uma no sistema oficial e outra paralela.

A atual situação financeira dos clubes é caótica. Você não acha que a má gestão indica que o texto precisa mesmo ser rígido para tentar assegurar melhorias no futebol?
Essa é uma das questões mais importantes que temos a estabelecer: o governo não quer a transparência mais do que os próprios clubes, as federações e a CBF. Só que o futebol quer que isso seja feito de forma racional, e não através de uma intervenção, de normas inconstitucionais que violam princípios fundamentais.

Vocês questionam o limite de reeleições?
Esse tema do número de mandatos em nenhum momento foi discutido entre CBF, federações e clubes. O que se discute é a violação ao princípio constitucional da liberdade associativa, a intervenção do estado na atividade privada, a violação do ato jurídico perfeito, o desrespeito à autonomia de organização e funcionamento das entidades do desporto.

Mas não é preciso melhorar a gestão do futebol brasileiro?
Aí é que está, a MP não assegura nenhum tipo de melhora de gestão, ela determina algumas questões que podem levar, em vez da cura, à morte.

O que pode levar à morte?
A MP estabelece que o clube pode ficar fora de competições se não cumprir determinadas normas. O clube pode não resistir a essa ausência. Clube que não joga fica inativo e, como uma empresa que interrompe suas atividades, deixa de ter receita. Clube que não joga não fatura, não recebe por transmissão, não tem patrocínio nem recursos de bilheteria. Mas os contratos que significam despesas continuam válidos. Isso pode significar a perda de receitas.

O que a CBF propõe para melhorar o futebol brasileiro?
É voz corrente entre clubes e federações a necessidade da melhora das práticas de gestão, o estabelecimento de práticas modernas, o rígido controle orçamentário, é unanimidade. Todos estão dispostos a fazer, o que ninguém aceita é a hipótese de em algum momento se determinar inatividade. A ruptura do sistema não melhora a gestão.

Qual sua opinião sobre a conta centralizadora para administrar as dívidas dos clubes?
É um dos aspectos que geram inquietude. Nos dias de hoje, falar que vai perder a gestão da própria conta corrente. Uma conta centralizadora única para receber todos os recursos produzidos, conta gerida por procuração outorgada pelo clube por uma instituição financeira que fará a gestão exclusiva de tudo que o clube produz de riqueza. Algo está em dissonância.

E a exigência de investimento no futebol feminino?
Não é razoável a determinação da migração das receitas produzidas pelo futebol profissional masculino para o feminino em proporção a ser definida por autoridade pública governamental. Se os clubes têm dificuldade em administrar o orçamento pelo futebol masculino em favor destes, imagine se tiver que dividir recursos com o feminino por força de lei.

A MP determina que no máximo 70% dos recursos do clube sejam investidos no futebol. O que acha disso?
Não há razão para ser 70, 90 ou 50. Não há como determinar como cada empresa vai usar seu dinheiro. Essas intervenções feitas por essa MP é algo sem precedentes. Determinar que uma empresa privada aplique seus recursos em determinada escala numa determinada atividade. Outros parcelamentos em escala muito maior foram concedidos sem nenhuma exigência dessa natureza.

Há a impressão de que o Campeonato Brasileiro poderia ser muito melhor do que é. Mais atraente, rentável, de melhor nível técnico. Como fazer o campeonato melhorar? Ou a CBF está satisfeita?
A CBF de hoje é uma entidade disposta a provar para a sociedade que está aberta e pronta para o diálogo. Há uma gestão que se pauta por modernidade, transparência e sintonia com o ambiente social. Ela toma decisões depois de ouvir os clubes, as entidades, todo o ambiente que faz parte do mundo do futebol. A CBF quer ouvir e não determinar o que deve ser feito. Não só o Campeonato Brasileiro, mas o futebol brasileiro como um todo não só pode como deve melhorar. A meta é que melhore a cada ano ouvindo as pessoas.

O que vocês estão fazendo para melhorar?
Os clubes e federações estiveram na criação dos novos regulamentos geral, de registro e transferências, uma comissão de clubes sem pauta pré-estabelecida foi criada. Um grande congresso do futebol será estabelecido nos próximos meses com treinadores, árbitros, atletas, jornalistas, para que todo tipo de opinião seja acolhida. Não há proibição de raciocínio. A CBF imagina que fará papel importante para que o futebol decida como será o futebol.

O Bom Senso criticou o fair play financeiro adotado pela CBF, semelhante ao da Federação Paulista, em que parte dos jogadores a denúncia contra salários atrasados. Você acha eficiente?
Tenho certeza que é absolutamente eficiente. Em nada depende da vontade da CBF um atleta procurar o órgão, seja por si, por advogados ou pelo sindicato para tornar mais impessoal, para que o atraso seja saneado. Só não vai funcionar se não houver denúncia. Dizem que o problema é a denúncia, mas não existe na Justiça um caminho hábil para estabelecer uma ação sem que se identifique a parte reclamante, a parte reclamada e o objeto da reclamação. O que não dá para ser feito é denúncia anônima, como alguns propõem de forma velada.

Quais serão os próximos passos da CBF para conseguir as mudanças que pretende na MP?
Os diálogos estão em andamento, as conversas existem, a CBF conversa com áreas envolvidas, inclusive o Bom Senso. A ideia é estabelecer aqueles pontos que, em vez de serem eficientes, são contraproducentes. Não em defesa dos clubes ou entidades, mas dos próprios jogadores.

Você concorda que a CBF se preocupa muito com a Seleção e não administra para os clubes?
Ao contrário de qualquer liga, a CBF abriu mão de receita proveniente da bilheteria dos jogos e dos contratos de televisionamento. São outras 13 competições feitas pela CBF, além dos subsídios para federações estaduais, muitas delas com competições deficitárias. A CBF gastou quase R$ 100 milhões em 2014. Ou seja, ela abre mão das receitas a que supostamente teria direito da Série A e gasta quase R$ 100 milhões no custeio das demais. Ela deixa de arrecadar o que uma eventual liga teria que arrecadar para custeio de gestão. Tabelas, organização, gestão do registro de atletas, arbitragem, etc. A CBF paga muito, muito da conta do futebol.

 

Fonte: CBF

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